Sabe aqueles jogos de tabuleiro em que, dependendo do número de casas que você anda, acaba caindo em uma roubada, tendo que pagar um mico ou andar para trás? Se o Planejamento Estratégico Comercial (PEC) fosse um desses, 10 armadilhas provavelmente apareceriam no seu caminho até o fim do jogo.
Elas foram identificadas na pesquisa que fizemos sobre PEC (confira os principais resultados deste estudo aqui) e analisadas e resolvidas por grandes especialistas do mercado.
Com as dicas que você vai conferir aqui, será muito mais fácil seguir sempre adiante no seu jogo de Planejamento Estratégico Comercial. Prepare os dados, e vamos lá!
1) Metas irreais – muito acima ou muito abaixo da capacidade e realidade da empresa
Essa armadilha começa com uma visão equivocada que as empresas têm sobre a definição de metas. “As organizações tendem a ver a meta como uma ferramenta de pressão sobre a equipe. Na verdade, as metas deveriam ser discutidas e pensadas muito menos em torno do volume, da quantidade ou do valor, mas muito mais em torno das estratégias. A pergunta deveria ser: ‘que estratégias nós temos para alcançar nossos objetivos?”, analisa JB Vilhena, presidente do Instituto MVC e coordenador acadêmico do MBA em gestão comercial da FGV.
E o grande problema é que esse erro prejudica todo mundo – do dono da organização ao cliente. Silvio Costa, Mestre em Administração, professor da FGV e consultor de Vendas, explica como cada grupo é afetado com isso.
É ruim para:
- O acionista e para o dono da empresa, porque não terão o retorno que esperavam;
- As lideranças, porque não conseguiram realizar seu plano de negócio;
- Os níveis menores de liderança, como gerência média, porque se a meta estabelecida não acontece aparece no final como “a área comercial não atingiu a meta”, o que dá uma sensação de frustração muito grande;
- O cliente, que pode ficar insatisfeito com a pressão do vendedor que quer fechar o negócio a qualquer custo.
Mas como evitar essa armadilha do Planejamento Estratégico Comercial?
Costa aponta o caminho: “é preciso montar o PEC de maneira profissional, sem achismos, sempre observando o que está acontecendo no mercado, fazendo a leitura do ambiente externo, usando ferramentas específicas para isso, tais como a matriz SWOT– que mostra as ameaças e oportunidades no mercado”.
2) Não levar em conta cenários externos do mercado ao fazer o Planejamento Estratégico Comercial
A segunda grande armadilha acontece principalmente por conta da falta de conhecimento de Marketing, na opinião de Vilhena. Como ele explica, “o marketing nos ensina que as decisões na organização têm que ser orientadas pelo e para o mercado. Do contrário, estamos tomando decisões que dizem respeito aos desejos, vontades, pretensões da empresa, mas que não fazem sentido na realidade”.
Elimar Melo, Mestre em Administração Estratégica e especialista em Gestão Empresarial, Comunicação Social e Administração de Marketing, acrescenta: “eu só posso dizer que sou forte ou fraco se eu comparo os meus resultados aos de outras pessoas. Então, até mesmo na análise interna é preciso levar em consideração o lado de fora”.
Ou seja, os motivos para evitar essa armadilha são claros. Porém, superá-la pode não ser tão simples. Para isso, o gestor precisa desenvolver duas capacidades:
a) Capacidade apurada e acurada de entender o seu mercado de atuação e antecipar novas movimentações dos concorrentes;
b) Capacidade de identificar a alternativa mais adequada para atingir os objetivos da empresa nesse contexto, de acordo com as suas próprias competências e recursos.
3) Não selecionar as pessoas adequadas para executar o que foi planejado
Se você não selecionar muito bem as pessoas para colocar o que foi planejado em prática, provavelmente vai voltar algumas casas no jogo do PEC. Aliás, esse é um erro comum, pois na hora de escolher as pessoas para trabalhar com o planejamento, as empresas acabam colocando profissionais que, normalmente, concordam com quem está à frente do planejamento; esquecem que a diversidade é importante.
Os especialistas que entrevistamos destacam ainda a importância de se levar em conta a contratação por competência.
“É preciso ter um perfil de competência e garantir que as pessoas contratadas se encaixam neste perfil. Isso, muitas vezes, torna o processo de recrutamento e seleção muito trabalhoso, mas com certeza mais eficaz”, aponta Vilhena.
Mas se na sua equipe você já tem os profissionais que precisa para que o PEC saia do papel, talvez o que falta seja treinar melhor esses profissionais. “Defina as competências necessárias para atingir os objetivos e metas e analise os funcionários para avaliar se eles têm essas competências. Se você busca, por exemplo, habilidade para inovação e foco no cliente e identificou que, de 0 a 10, alguns de seus profissionais têm nota 6, precisa promover meios para elevar a performance dos profissionais nesse sentido”, explica Elimar Costa.
4) Mudar diversas vezes o plano, as metas e os indicadores de performance do Planejamento Estratégico Comercial
“Isso, infelizmente, é uma mania brasileira, porque as pessoas colocam indicadores de performance estreitamente relacionados à remuneração”, opina Vilhena. Segundo ele, neste fato existem dois problemas: um é uma certa falta de competência de alguns gestores na formulação do indicador, porque são extremamente viciados em indicadores quantitativos, principalmente no que diz respeito ao volume de vendas ou a receitas. “Não há uma cultura de buscar outros tipos de indicadores, como satisfação do cliente, por exemplo”, analisa.
Outro problema é que, quando o vendedor está tendo um resultado interessante e ele vai ter uma remuneração substancial, mudam-se os indicadores para diminuir a remuneração, o que afeta a motivação e até mesmo os resultados dos profissionais.
A falta de paciência dos gestores, que muitas vezes gostariam que os resultados surgissem da noite para o dia, é, para Elimar, um dos motivos que ocasionam essa armadilha. “As pessoas querem o resultado para ontem, e isso não acontece de jeito nenhum. E, quando acontece, o resultado vira um resultado prematuro. Uma coisa é ter necessidade e urgência de fazer as coisas com critério e rapidamente, outra coisa é fazer com pressa”, ressalta. Assim, se você quer colher os frutos do seu PEC bem planejado e estruturado, precisa dar tempo ao tempo.
5) Falta de metas mais objetivas (planejamento muito amplo)
Elimar Costa acredita que as metas não podem simplesmente ser divididas pelo número de vendedores ou filial. “É preciso entender qual mercado está comprador, qual está recessivo, para quem eu posso vender mais, para quem vou vender quantidade, para quem vou vender margem, para quem vou vender soluções integradas e assim por diante”, revela.
Além disso, para que as metas sejam objetivas, elas precisam ser divididas por produtos, equipes e tipos de clientes, opina o especialista. Assim, cada um terá metas ajustadas à sua realidade e de fato objetivas.
Costa destaca ainda que é preciso que as empresas estabeleçam metas qualitativas: de margem, de inadimplência, satisfação de clientes, market share, etc. “Uma situação comum é a seguinte: vem a informação para a equipe de vendas estabelecendo que agora a meta não é mais R$ 15 milhões, e sim R$ 18 milhões. Ninguém fala se deve ser preservado o market share, se a margem deve ser mantida ou pode ser reduzida. Aí, os vendedores saem fazendo de tudo para vender mais, inclusive dando desconto e, dessa forma, mesmo atingindo a meta, o lucro da empresa como um todo sai prejudicado”, explica.
6) Basear-se em métodos ultrapassados
Outro erro identificado em nossa pesquisa foi a utilização de métodos ultrapassados no desenvolvimento do Planejamento Estratégico Comercial. Na análise de Luis Roberto Mello, isso acontece porque os gestores estão despreparados. Como ele destaca, em média os gerentes dedicam menos de três horas por semana para discutir questões estratégicas. Assim, oportunidades de mercado deixam de ser identificadas, objetivos dissonantes são estabelecidos, a capacidade de inovação nas estratégias e processos comerciais é reduzida e os recursos são usados de maneira ineficiente.
Faz parte de um PEC de sucesso a preparação de quem o comanda. Por isso, a sugestão de Mello é que você mantenha-se sempre atualizado para usar ferramentas mais adequadas para o momento sempre que for planejar os próximos meses ou anos da sua organização.
7) Não acompanhar e não registrar os resultados do Planejamento Estratégico Comercial
Como você já deve ter percebido, uma armadilha pode levar a outra. A falta de preparo citada anteriormente, por exemplo, pode ocasionar um acompanhamento precário dos resultados. “Gerentes ultrapassados não apresentam conhecimentos e habilidades necessários para o correto acompanhamento dos resultados, sobretudo se forem resultados oriundos de negociações complexas, que envolvem valores maiores ou que apresentam ciclo longo até o fechamento. O gestor não tem só que gerenciar resultados, ele precisa gerenciar processos”, analisa Elimar Costa.
Sobre as consequências dessa falta de acompanhamento, o especialista destaca que isso resulta numa gestão empobrecida, já que, assim, é impossível formular táticas e estratégias que viabilizem os resultados.
“Sem resultados registrados, a definição das metas futuras é impossível, aumentando o risco de novos erros na meta, criando um ciclo negativo”, pondera o especialista
Aliás, ele defende que a periodicidade e as condições de avaliação dos resultados desejados devem ser definidos no próprio PEC, agilizando e organizando o processo. O especialista destaca que há inúmeras ferramentas disponíveis no mercado que podem ajudar nessa etapa, “mas caso haja dificuldade em encontrar um software ideal, uma simples planilha no Excel já garante um bom modelo de gestão de resultados”, sugere.
8) Falta de comunicação com a equipe de vendas
Não existe Planejamento Estratégico Comercial sem comunicação. “A equipe de vendas tem que ser fornecedora de insumos para o planejamento e a empresa deve utilizar todo o conhecimento que a equipe tem de campo para tornar a qualidade do planejamento maior por sua aderência à realidade”, explica Vilhena. Além disso, para que o PEC atinja seus objetivos é fundamental que a equipe seja comunicada sobre as decisões tomadas nas reuniões.
“Existem empresas que fazem o planejamento e escondem da própria equipe, porque é ‘estratégico’. Isso não faz sentido, pois a equipe é que fará os objetivos serem alcançados, ela precisa saber o que está sendo proposto”, conclui o presidente do Instituto MVC.
Buscar a transparência no relacionamento com os integrantes da equipe, o contato constante, as trocas de ideias e dar espaço para que todos opinem ajuda a aprimorar a comunicação e a acabar com essa armadilha.
9) Falta de finalização das ações
“As pessoas têm muita iniciativa e pouca acabativa”. A frase clássica do mundo dos negócios ilustra bem esse erro que muitas vezes detona com o Planejamento Estratégico Comercial de uma empresa. “Na hora do planejamento, todo mundo é corajoso e realizador. Mas na hora de fato realizar e acontecer não é bem assim”, afirma Elimar Costa.
Como destaca Vilhena, o problema é que os gestores têm o compromisso de em uma determinada época do ano planejar, e depois de um certo tempo esse planejamento vai para o fundo de uma gaveta qualquer, sem ser acompanhado, sem ser um instrumento de correção de rumo, de correção das ações.
Nesse sentido, Luis Roberto acredita que para que o PEC traga resultados, “a organização deve criar mecanismos que obrigue o gestor a alocar recursos (tempo, capacidade analítica e outros) no processo de Planejamento Estratégico Comercial. Quando esse mesmo gestor estabelece parâmetros para os processos operacionais e dá autonomia aos seus vendedores, ele consegue mais recursos para a discussão estratégica, trazendo mais resultados práticos”, salienta.
10) Falta de cobrança de resultados
Apesar de ser a décima (e última) armadilha, esse erro poderia facilmente ser encaixado antes no item 9. Afinal, a falta de cobrança de resultados está diretamente ligada à falta de finalização das ações.
O fato é que, como Vilhena lembra, esse erro começa na definição de planejamento. “Como o planejamento foi feito apenas por ser um ritual, por ter que planejar, e não para ser um instrumento de correção de rumo, o gestor acaba não controlando, não corrigindo os resultados, não aproveitando novas oportunidades. Porém, a ideia não deve ser esta. O planejamento é um instrumento dinâmico, não pode ser uma prescrição rígida do que deve ser feito. Ele precisa assumir uma faceta de flexibilidade para poder permitir que as pessoas corrijam aquilo que não está dando certo”.
Elimar aponta ainda a importância de motivar os profissionais no pós-PEC. “É preciso lembrar as pessoas que elas têm responsabilidades dentro da equipe, que suas tarefas são fundamentais para o cumprimento dos objetivos. É necessário também lembrá-las do propósito de cada meta. Comercialmente, os gestores costumam cobrar apenas resultados de vendas, e esquecem de cobrar as realizações”.
Ou seja, é preciso ter um acompanhamento de perto, indicadores que mostrem quais objetivos serão ou não atendidos e quais vendedores estão mais perto deles. Com o passar do tempo, é possível ir ajustando as metas de acordo com a realidade dos clientes que cada vendedor atende para que elas sejam, efetivamente, alcançadas.
Fonte: venda mais